Estado forte, interventor ou mais autonomia do cidadão?

Artigo escrito por Renato Junqueira, presidente da Fundação Republicana Brasileira – FRB

Publicado em 13/3/2018 - 00:00 Atualizado em 5/6/2020 - 12:16

Esse é o dilema que assola a maioria dos líderes políticos, principalmente em momentos de eleição presidencial, como teremos daqui alguns meses. Para alguns, necessariamente o Estado deve intervir na economia, adquirindo e controlando empresas estatais; além de viabilizar tudo aquilo que a maioria dos cidadãos julgam ser de responsabilidade exclusiva do governo. Educação, emprego, saúde, previdência, transporte, lazer, cultura e vários outros aspectos que inclusive, a Constituição Federal classifica como direitos sociais. Entretanto, a população está cansada de saber que esse modelo que concentra muitas obrigações ao Estado nunca foi a melhor alternativa. Prova disto são os hospitais públicos lotados, onde faltam médicos, e escolas sucateadas com ensino de baixa qualidade.

A ideia do Estado Mínimo surgiu do pensamento do filósofo norte-americano Robert Nozick (1938-2002) em resposta a outro filósofo político também norte-americano chamado John Rawls (1921 – 2002), que afirmava que o cidadão deveria viver em um estado de bem-estar social, uma sociedade que garantisse um mínimo existencial para todas as pessoas, inclusive com as mesmas oportunidades. A filosofia do Robert Nozick é uma defesa forte aos direitos invioláveis; o direito à vida, liberdade e à propriedade. Para Nozick, o único Estado moralmente legítimo é o Estado Mínimo. Sua função é garantir a proteção dos cidadãos do roubo de outros indivíduos, da violência e da fraude. Criando um ambiente propicio à execução de contratos. Desse modo, o Estado Mínimo não transgrediria os direitos invioláveis.

Essa concepção de que o Estado precisa estar no centro de todas as decisões é tão complicada que acaba contrariando a lógica de coisas que enfrentamos no dia a dia. Ao se deparar com uma irritação na pele, qualquer pessoa sabe que precisa procurar um dermatologista, que é a especialidade que se ocupa em tratar da pele humana. E seria um desperdício de tempo perguntar ao neurologista ou obstetra qual a solução para o seu problema de pele, embora eles possam saber como o tratamento deve ser realizado, porque obviamente estudaram Medicina. Um médico de outra especialidade jamais teria de pronto o procedimento mais adequado para resolver aquele tipo de problema ou o medicamento mais recente para atacar aquela patologia. Assim é a ideia do Estado forte, ele tenta resolver problemas de diversas áreas, porém não é especialista em nenhuma função. O resultado são políticas públicas de baixa eficiência.

A aptidão por especialização está presente em todas as dimensões das nossas vidas. Na ciência não é diferente. Já dizia o escritor Rubem Alves que “a tendência da especialização é conhecer cada vez mais de cada vez menos”. É por esse motivo que muitos estão à procura de se tornarem especialistas em um assunto, e dessa forma fazem pós-graduação, mestrado e doutorado, para que dominem com veemência determinada área. Porém, para aqueles que são contrários à visão do Estado Mínimo isso não faz o menor sentido. Para eles, o controle de grandes empresas estatais geraria valiosos dividendos ao governo, no entanto, a operação Lava Jato e outros escândalos políticos do passado tem nos mostrado que tais empresas não são nada rentáveis e ainda favorecem a formação de esquemas de corrupção.

No início do segundo mandato do governo Lula, em 2003, ao ser entrevistado pelo jornal Folha São Paulo a respeito de um dos seus principais projetos, o Fome Zero, o então presidente, que é a favor do Estado forte e interventor foi enfático em dizer: “É preciso dar o peixe e ensinar a pescar”. De acordo com a lógica do Estado Mínimo, o importante não é dar o peixe, e sim criar condições favoráveis à pesca, de modo que todos possam comprar as suas tralhas e acessar o rio para lançar sua rede. Além disso, também é necessário a garantia da segurança para que ninguém roube o seu pescado e assim o pescador poderá comercializá-lo.

Diferente do Estado forte e interventor, o que precisamos é de um cidadão com mais iniciativa, que não fica parado esperando a ajuda do governo, mas que se organiza em associações de bairros para reformar a praça ou quadra poliesportiva da sua comunidade, contando com o apoio do setor privado. Um exemplo de sucesso é o caso do município de Ribeirão Bonito, no interior de São Paulo. O pacato município conta com 12 mil habitantes e vive basicamente da agricultura e pecuária. Ao longo do tempo a população observou que a qualidade dos serviços públicos estava caindo demais. Para os moradores era como se a cidade estivesse sem governantes: escolas sucateadas, praças e ruas depredadas. A partir dessa triste situação que os cidadãos resolveram se juntar e fazer algo em prol do município. Foi então que surgiu a AMARIBO – Associação de Amigos de Ribeirão Bonito. Com a criação dessa associação, as pessoas se sentiram encorajadas a denunciar os desvios de verbas de merenda escolar, combustível e outros abusos do poder, restabelecendo vitalidade dos serviços públicos. Em resumo, além de um Estado Mínimo o que precisamos é de mais autonomia e independência dos cidadãos em assuntos públicos.

*Renato Junqueira é presidente da Fundação Republicana Brasileira – FRB

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